30 de novembro de 2013

Novos caminhos

Novos caminhos
Foi divulgada na última terça-feira, 26 de novembro, a Exortação Apostólica Evangelii Gaudium - Alegria do Evangelho -, a primeira do Papa Francisco. Já no último domingo o documento havia sido entregue, de forma simbólica, durante a celebração de encerramento do Ano da Fé e na Solenidade de Cristo Rei a um grupo de fiéis. Não gostaria aqui de pretender fazer resumo ou coisa parecida de um documento de suma importância, mas sim de chamar a atenção para a dimensão do mesmo e da necessidade que temos de lê-lo, interpretá-lo, refleti-lo. Segui um pouco as agências de noticiais internacionais para ver como elas trataram a notícia desse documento, qual enfoque, qual frase. Conclusão: todas são unânimes em chamar a atenção sobre a dimensão do texto, da reviravolta proposta pelo Papa Francisco, da necessidade de abertura da Igreja Católica, e da crítica a uma ordem econômica mundial que muitas vezes gera violência. Francisco de modo sutil e direto chama a atenção para a construção de um mundo mais justo, de uma Igreja que esteja a serviços dos últimos, dos marginalizados, dos excluídos. Volta a recordar a teoria do “desperdício”.

A Exortação do Papa Francisco não é um documento só para os cardeais, bispos, sacerdotes e religiosas, mas sim para todo o Povo de Deus; não devemos pensar que só o clero, os ordenados e consagrados devem refletir e aplicar as indicações e as propostas de Francisco. As exortações apostólicas são documentos papais, contendo recomendações. Em termos de solenidade, situam-se abaixo das encíclicas e acima das cartas apostólicas.

Voltando à Evangelii Gaudium, o Papa Francisco no seu longo texto de mais de 200 páginas centraliza a sua atenção na difusão da mensagem de Cristo, e o faz de um modo diferente e acessível a todos, tocando temas que vão desde a economia global à reforma das estruturas eclesiásticas. Durante a apresentação da Exortação Apostólica no Vaticano, o Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, Dom Rino Fisichella, disse que a mesma pode ser resumida como um documento escrito à luz da alegria para redescobrir a fonte da evangelização no mundo contemporâneo. O Papa Francisco “infunde coragem e provoca um olhar adiante, apesar do momento de crise, fazendo, uma vez mais, da cruz e da Ressurreição de Cristo a ‘bandeira da vitória’”.

Um texto denso que recebeu também a contribuição de cardeais, arcebispos e bispos de todo o mundo que participaram no ano passado do Sínodo para os Bispos que teve como tema precisamente “A nova evangelização para a transmissão da fé”. O documento de Francisco, tem caráter universal, mas reflete, em certo modo, a sua experiência na realidade latino-americana; nessa realidade a espiritualidade se encarnada na cultura dos mais simples.

Nos seus 288 parágrafos o documento está dividido em 5 capítulos: a transformação missionária da Igreja, a crise do compromisso comunitário, o anúncio do Evangelho, a dimensão social da evangelização e evangelizadores com espírito. O que mantém unido essas temáticas é o amor misericordioso de Deus, que vai ao encontro de cada pessoa.

Nas tantas reflexões que o Santo Padre compartilha com quem lê a Exortação estão muitos convites para que o fiel renove o seu encontro, a sua relação com Cristo, e se deixe encontrar por Ele, buscando-O sem cessar.

O texto simples e convidativo nos faz ver a real visão que o homem que “veio do fim do mundo” tem sobre as necessidades de mudanças não só da Igreja, - e isso é evidente – mas também no comportamento de todo homem, num mundo que se fecha cada vez mais no seu egoísmo e indiferentismo. Francisco sacode mais uma vez as nossas consciências, as consciências de todos os homens de boa e sem vontade. Prioridade aos pobres, na linha do pobrezinho de Assis, alertando que a pobreza gera violência; junto com isso pede a liberdade de professar a fé a quem quer que seja, recordando os cristãos no Oriente Médio.

O Papa não se furta de tocar no assunto da “saudável descentralização” da Igreja, com maiores responsabilidades para os leigos; convida o clero a “romper esquemas”, a serem audazes e criativos, numa Igreja missionária, alegre aberta a todos principalmente aos jovens; denuncia a globalização da indiferença, assim como o tráfico de seres humanos; pede aos países que acolhem imigrantes "uma generosa abertura" e ajuda para as mulheres que sofrem situações de exclusão, maus-tratos e violência. Sobre o aborto, legalizado em quase todos os países da Europa, o Papa reconhece que “não se deve esperar que a Igreja mude sua postura sobre o tema, pois não é ser progressista resolver problemas eliminando uma vida humana”. Ainda o tema da relação com os muçulmanos, e com as outras confissões.

“A alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus… Quero, com esta Exortação, dirigir-me aos fiéis cristãos a fim de os convidar para uma nova etapa evangelizadora marcada por esta alegria e indicar caminhos para o percurso da Igreja nos próximos anos”. Essas são as palavras do início a Exortação Apostólica e o convite de Francisco com a sua “Evangelii gaudium” para um novo momento de fé, de esperança e de Igreja. Boa leitura, e boa reflexão.

Silvonei José Protz
Colunista do Blog Evangelizando.
Diocese de Roma (Itália). Doutor em comunicação e professor universitário em Roma. Jornalista da Rádio Vaticano: "a voz do Papa e da Igreja em diálogo com o mundo".

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